O Divã.

- Boa noite, queira se deitar.
- Ui! Mas nem um jantarzinho antes?
- Hã? O quê?
- Hum.. nada!
- Certo... bom Natália, acho muito bom quando as pessoas vêm aqui por vontade própria. E sei que tem algo em especial que você possa querer conversar sobre. Sabe me dizer o que é?
- É... bom... não sei exatamente. Ando me sentindo meio triste.
- E você sabe por que?
- Perdi algo importante.
- Um amigo?
- Não.
- Parente?
- Não.
- Bem material?
- Não.
- Você não está ajudando muito, não é?
- Não.
[...]
- Me fale sobre sua infância.
- Hum... foi legal.
- Algum trauma?
- Alguns.
- Graves?
- Nah...
- Me fale sobre eles.
- Eu fiquei meio sequelada quanto a movimentos bruscos perto de mim por causa da minha prima.
- Como assim?
- Bom, ela me batia quando eu era pequena. Aí se alguém faz algum movimento de repente, eu me assusto e me encolho feio um hamster acuado.
- Ela te batia? Quantos anos ela tinha?
- Uns 4.
- E você?
- Er... 5.
- Ah sim, entendo. Mais algum trauma?
- Tem sim. Nada grave, no entanto.
- Não é sério mas te encomoda, certo?
- É...
- Quer conversar sobre isso?
- Quero.
- Então fale do que se trata.
- Eu num quero falar disso com você.
- Quer falar com quem?
- Sei lá! Comigo mesma.
- Você fala sozinha com freqüência?
- Falo.
- Mais de 30 minutos por dia?
- Pffffff... bem umas 4 horas por dia! Eu tenho muito o que dizer pra mim mesma.
- E seus amigos?
- Nem me fale deles.
- Por quê?
- É por causa deles que eu tô aqui.
- Hum... algum tipo de briga?
- É, um tipo de briga. Mais como uma competição, entende?
- Como assim?
- Uma aposta.
- Aposta?
- É. Eu perdi.
[...]